domingo, 21 de outubro de 2012

Fronteiras: Serra das Mesas - Nascente do rio Côa (f. dos Fóios, c. do Sabugal)

Depois de uma etapa de inactividade, volto com energias renovadas ao blogue para continuar com o percurso por estas nossas terras raianas. Realmente as férias foram mesmo muito boas, mas o retorno não foi assim tanto, talvez por oposição ao lazer descontraído que costumamos ter quando estamos fora de casa. A questão é que não me apetecia fazer nada; daí a minha demora em publicar mais entradas ou atender as minhas contas do Facebook e do Twitter. Celebro que, entretanto, o número de visitantes e o número de «fãs» que aderiram ao blogue tenha aumentado até aos 54 amigos actuais na rede social Google e aos 191 no Facebook. Umas calorosas boas-vindas para todos eles!

Aproveitando a minha viagem recente que me levou, entre outras partes, ao interessantíssimo concelho do Sabugal, no distrito da Guarda, na Beira Interior, vou falar hoje da Serra das Mesas e da nascente do rio Côa. Da vila do Sabugal, da qual teremos oportunidade de falar noutra entrada, uma estrada serpenteia seguindo o curso do rio Côa pelas aldeias de Quadrazais, Vale do Espinho e, finalmente, os Fóios. As paisagens são absolutamente maravilhosas, pois contornam a Serra da Malcata, indicada convenientemente nos trilhos que existem ao longo da estrada e que nos permitem fazer caminhadas em plena natureza. Para quem desejar um refrescante banho num dia quente de Verão, existe um pequeno parque de merendas à saída de Quadrazais, um caminho de terra batida que em 200 metros leva-nos ao rio Côa e à reserva natural da Serra da Malcata, sendo que o rio oferece uma bela vista do lugar, contornado por árvores que fornecem sombra e dão esse ar fresco pretendido em dias quentes. A água costuma estar fresca e é altamente relaxante e o banho é absolutamente seguro porque permite-nos mergulhar no rio sem que exista perigo por afogamento, devido à escassa profundidade, já que não chega a cobrir uma pessoa de tamanho médio.

Uma vez passada a aldeia dos Fóios, freguesia e sede da mesma, na qual encontraremos belos exemplos de casas tradicionais e até restaurantes que por um bom preço permitem-nos deliciarmo-nos com uma boa refeição, a estrada começa uma subida, de início suave, como aliás, tem-se verificado a partir do ponto em que a apanhamos no Sabugal, para iniciar uma subida com mais pendente onde não raro, encontraremos, dependendo da hora, rebanhos de ovelhas com o pastor e o cão a guiá-las, cena absolutamente linda e que nos faz entrar em comunhão com a natureza. Ao chegarmos a um pequeno planalto em que encontrámos um entroncamento de estradas: de um lado podemos seguir pelo caminho de terra batida (em mau estado, diga-se tudo) que nos leva à Serra Alta, na qual está situado um parque eólico e da qual temos belas vistas da peneplanície de Ribacôa e das vizinhas terras da província de Salamanca. A frente continua a estrada para a localidade raiana da Aldeia do Bispo; à direita, com sinalização «Espanha», é possível chegar ao limite fronteiriço entre os Fóios e Navasfrías, aldeia de Salamanca da qual temos falado e que, neste caso, apresenta a particularidade de que a estrada portuguesa, asfaltada, dá lugar a um caminho de terra batida no outro lado da fronteira.

No entanto, mesmo à entrada, no início da estrada a Navasfrías, temos uma estrada que vai para a nascente do rio Côa e a Serra das Mesas. Uma estrada que, como teremos ocasião de ver noutra entrada, tem como particularidade que numa parte dela, a fronteira decorre mesmo ao lado. Por uma paisagem de floresta de abetos, carvalhos negros e castanheiros, sempre a mais de 1 000 metros de altitude, serpenteamos uma espécie de planalto que abandonamos logo quando, numa curva, iniciamos o ascenso à Serra das Mesas, contornando-a. Perto do seu final, uma pedra avisa-nos que estamos perante o trilho pelo qual podemos aceder à nascente do rio Côa e à parte mais alta da Serra. 

Iniciado o caminho, a nascente não fica muito longe, se bem o rio Côa é mais um produto da união de vários regueiros que podem ser, qualquer um, a sua nascente. Tradicionalmente, no entanto, é a que vamos ver nas fotos, a que foi considerada como sendo a própria. Uma vez visto este pequeno recanto, podemos iniciar uma ascensão à serra é bem cedo encontramo-nos com uma vedação de arame, que lembra os tempos da outra senhora, e os marcos fronteiriços que delimitam a linha de fronteira, que em alguns pontos, não segue exactamente a linha de cumes, mas sim a encosta superior da serra vista do lado português. Como as visitas que fiz foram na Primavera e o Outono, as fotografias são de diferentes estações, já que tive azar. Na primeira vez, enquanto a minha mulherzinha, com o almoço no bandulho e pouca vontade de sair do carro (estava frio e havia até restos de neve), ficou lá, a ler, sossegadinha, um livro, eu não pude completar a visita, não pelo frio, se bem que em alguns momentos a caminhada era um bocado perigosa a causa da humidade, que favorecia o escorregamento nas rochas graníticas da serra, mas sim porque começou a cair uma forte tormenta de granizo e apanhei uma saraivada do caraças. Tanto foi assim que tive de ir na farmácia mais próxima, já em Vilar Formoso, comprar um xarope e comprimidos para a constipação! Na segunda ocasião também choveu e até escorreguei, mas consegui acabar de visitar o lugar e completar as fotografias que tinha em falta. É por isto que esta entrada é fruto de experiências um bocado atribuladas. Espero que apreciem, se não, ainda vos bato!

Como estava a dizer, essa vedação que segue a linha de fronteira, continua até um ponto em que a serra eleva-se ate ao ponto mais alto, de 1 265 metros, em que está situado ainda outro marco fronteiriço. Daí em  pronunciado declive inicialmente e depois de forma suave, a linha de fronteira curva-se para dar a sua continuidade pela Serra da Malcata. 

A paisagem envolvente resulta do mais interessante. A própria Serra das Mesas forma parte da Serra da Malcata, sendo o seu ponto de ligação com a Serra de Gata, que separa Salamanca da Extremadura espanhola. Ambas as duas serras fazem parte da chamada Cordilheira Central, no seu sector ocidental, que terá continuidade na Serra da Estrela. Mas esta serra apresenta uma particularidade muito interessante. Não é apenas o facto de ser uma serra fundamentalmente granítica, mas sim o modelado, que evidencia uma evolução geológica ímpar. Cá não encontramos a típica paisagem beirã de barrocais, com penedos graníticos arredondados e formas caprichosas fruto da erosão como podemos ver, por exemplo, na aldeia de Monsanto, caso típico de caos granítico ou Inselberger. Neste caso, a meteorização, isto é, os processos erosivos, foi de tipo esferoidal, dando lugar à chamada meteorização em «casca de cebola». É precisamente isto o que dá nome à Serra das Mesas, já que as camadas graníticas, como se fosse uma cebola, apresentam formas absolutamente planas e em horizontal, de forma que dá lugar a «mesas», ou blocos cúbicos graníticos camadas, que o imaginário popular fez com que a serra recebesse esse nome.

De um lado, no declive da serra encontramos um lameiro ao sopé da serra, bastante amplo, em que há vários regueiros e encontramos até pequenos poços de água. Esse conjunto recebe, significativamente, o nome de Planalto do Lameirão e como curiosidade, caminhar entre a vegetação não resulta de todo fácil porque, para além dos regueiros, não é de todo chã. Aliás, como é típico das pradarias de tipo alpino, a terra apresenta-se mais arejada a causa da erosão ou meteorização que a neve e as geadas provocam. Daí que ao pisar o capim, pareça que estejamos a pisar uma superfície almofadada. Do outro lado, para norte, um pequeno conjunto de formações rochosas, separa esta zona do declive em que se encontra a nascente do Côa e o planalto que se segue ao lado da linha de fronteira.

Só resta agora passar um bom bocado a apreciar as fotografias. Espero que gostem!

Foto 1. Indicador em pedra da nascente do Côa.
Foto 2. Acesso à nascente e à Serra das Mesas. 
Foto 3. Nascente do Côa. Não resulta fácil encontrar o lugar porque não há sinalética nenhuma.
 Foto 4. Paisagem vista numa encosta da Serra das Mesas, com o Planalto do Lameirão em primeiro lugar.
 Foto 5. Planalto visto em direcção aos Fóios com o Planalto do Lameirão em primeiro plano.
 Foto 6. Vistas para a Serra da Estrela que as nuvens não permitem apreciar.
Foto 7. Vedação de arame e marco fronteiriço pouco antes de chegar ao ponto mais alto da serra.
Foto 8. Marco fronteiriço, visto do lado português.

Foto 9. Marco fronteiriço nas Mesas, a 1 265 metros de altitude.
Foto 10. Vista do marco fronteiriço e das formações graníticas em «mesas».
Foto 11. Vista, a partir do barrocal, para a Serra da Estrela e a planície da Beira Baixa.
Foto 12. Outra vista das Mesas, com leve nevoeiro.
Foto 13. Mesa dos Quatro Bispos, exemplo perfeito deste tipo de formações geológicas em «casca de cebola». O nome deve-se ao facto de coincidir, neste ponto, os limites das dioceses da Guarda, que substituiu a antiga diocese de Egitânia (actual Idanha-a-Velha), a diocese de Ciudad Rodrigo, que em tempos abrangia ainda os territórios de Ribacôa, na posse do reino de Leão, a diocese de Coria (hoje Coria-Cáceres) e a antiga diocese de Castelo Branco, hoje extinta, de forma que na realidade devia ser hoje  a Mesa dos «Três Bispos». Mas História é História...
Foto 14. A descer da Mesa dos Quatro Bispos, pela linha fronteiriça. Infelizmente a vedação que faz perigoso tentar um pulo, não nos permitiu aceder, para ver as paisagens, ao vale, já na Extremadura espanhola, em que estão situados os chamados «Três Lugares» (Valverde, As Elhas, S. Martino do Trevelho), em que se fala um dialecto galego-português. 
Foto 15. Outro marco fronteiriço.
Foto 16. Vista geral da vedação, do marco fronteiriço e da serra.



Ver Serra das Mesas num mapa maior
Mapa 1. Mapa de situação.

Mapa 2. Mapa específico.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Documento histórico: Cambedo da Raia (c. de Chaves) e a Guerra de Espanha

Com a inestimável ajuda de Luís Filipe Braz, um dos meus amigos do Facebook, pude obter um artigo jornalístico de 1987 relativamente aos acontecimentos que houve no Cambedo da Raia, na região do Alto Tâmega, no concelho de Chaves, em 1946 como consequência da Guerra de Espanha, relacionados com factos que tiveram lugar no outro lado da fronteira, no Alto Tâmega pertencente à Galiza.

Reproduzo aqui o artigo. As imagens poderão ser visualizadas num tamanho maior já que vou disponibilizá-las no meu mural de Facebook simplesmente clicando sobre elas. Apesar de alguma falta de definição, são perfeitamente legíveis. 

Espero que gostem e início com esta entrada a minha (demorada) rentrée neste último trimestre do ano.