segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Fronteiras: A fronteira no Guadiana (Monsaraz/Ribeira de Cuncos)

Um dos lugares mais aprazíveis para passar o final da tarde nos arredores da vila de Monsaraz e poder contemplar as terras raianas é o ancoradouro ou embarcadouro de Monsaraz. Isto porque permite observar, mesmo que seja de modo panorâmico, espaços que de outra forma seriam impossíveis de serem apreciados pela sua dificuldade no acesso. O embarcadouro é acessível a partir da estrada N514 vindo, quer da aldeia do Telheiro, quer de Monsaraz. Na pequena aldeia do Ferragudo há uma indicação para o Convento da Orada numa rotunda. É essa a direcção que deve tomar-se para chegar até este ponto. Após passar algumas herdades, a beleza indescritível do Guadiana e do Grande Lago de Alqueva é uma realidade ao chegarmos a uma pequena área de lazer onde não falta o típico café, um parque infantil e o embarcadouro com as docas flutuantes para a chegada e amarre dos barcos que passeiam pelo rio.

O espaço fica exactamente no ponto de confluência da Ribeira de Azevel, na margem direita do Guadiana, e da Ribeira de Cuncos, na margem esquerda. A Ribeira de Cuncos, apesar de não passar de um riacho, tem especial relevância na delimitação da fronteira. O próprio rio serve de fronteira nos últimos quilómetros entre Portugal e Espanha antes de desaguar no Guadiana pela margem esquerda. A partir do ponto em que o riacho é totalmente espanhol, uma linha de fronteira quase recta parte a planície que separa o Alentejo da Extremadura espanhola até à fronteira de São Leonardo, que comunica a vila de Mourão com a vizinha extremenha de Villanueva del Fresno pela N256-1. 

Mas não só. A Ribeira de Cuncos foi designada como limite a partir do qual continuariam os trabalhos de delimitação da fronteira com o Tratado de Limites de 1927. Lembre-se o facto de que o Tratado de Limites de Lisboa de 1864 tinha dado lugar a uma série de trabalhos de delimitação da fronteira que ficaram interrompidos na foz do Caia, na confluência deste rio com o Guadiana a causa da disputa pelo território de Olivença. O não reconhecimento da soberania espanhola sobre este território fez com que do Caia até à foz do Guadiana em Vila Real de Santo António não houvesse nenhuma delimitação aceite pelos dois estados. Para ultrapassar isto, ficou decidido que a Ribeira de Cuncos seria o ponto em que os trabalhos recomeçariam, facto que permitiu finalizar a delimitação da fronteira Sul. Restam ainda cem marcos fronteiriços correspondentes ao espaço entre a foz do Caia e este ponto, mas não é de esperar que essa situação se resolva em breve. Para complicar mais a situação, o acordo internacional referido às águas dos principais rios ibéricos, segundo foi assinado no Tratado de Águas de 1967, dá a Portugal a posse das águas de ambas as margens do Guadiana entre o Caia e a Ribeira de Cuncos, em vez de estar delimitado pelo ponto médio existente em cada rio como aconteceu com os outros rios como o Minho, o Douro ou o Tejo na sua parte internacional. Esta solução permitiu a Espanha chegar a um acordo sem reconhecer a reclamação portuguesa de Olivença e Portugal mostrou assim que também não renunciava a este território, o que não deixou, no entanto, de ocasionar alguns atritos, designadamente na Ponte da Ajuda ou os relacionados com a navegabilidade do Guadiana que serão oportunamente tratados em 'posts' posteriores.

De qualquer forma, fora de disputas políticas, o passeio vale mesmo a pena, pela paisagem envolvente e pela beleza intrínseca do lugar. Para além de Monsaraz, visita óbvia, vale a pena ver o Convento da Orada, um convento do século XVIII construído no lugar em que D. Nuno Álvares Pereira terá rezado antes de várias batalhas contra Castela, ou o Cromeleque de Xarez, único monumento transferido para outro local aquando da construção da barragem de Alqueva.  E para quem quiser, é possível dar passeios pelo Grande Lago em barco, quer em roteiros estabelecidos por empresas do lugar com duração de 1 ou 2 horas com possibilidade de almoço incluído, quer por intermédio do aluguer de embarcações para as quais não é preciso experiência nenhuma com uma duração de até 7 dias, no «resort» da Amieira Marina. Pena é, neste Inverno de 2012, a situação de seca extrema que temos vindo a padecer pela falta de chuvas nestes últimos dois meses e que está a afectar já à agricultura da região.


Foto 1. Foz da Ribeira de Cuncos vista do embarcadouro de Monsaraz. As linhas vermelhas indicam a fronteira delimitada.
Foto 2. Mesma foto que a foto 1, mas sem marcas.
Foto 3. Monte de Domingo Lopes (c. de Mourão), mesmo no limite fronteiriço.
Foto 4. Vista da planície e do Grande Lago de Alqueva entre os concelhos de Reguengos e Mourão. Advirtam-se os efeitos da seca.
 Foto 5. Vista do embarcadouro de Monsaraz ao pôr-do-sol.
Foto 6. Viaduto do Guadiana (N256) e Grande Lago vistos do embarcadouro de Monsaraz.
Foto 7. Área de lazer do embarcadouro.
Foto 8. Convento da Orada (vista da fachada).
Foto 9. Convento da Orada visto do cromeleque de Xarez.
Foto 10. Cromeleque de Xarez (vista geral). Mais informações aqui.



Mapa 1. Mapa de situação.

Mapa 2. Mapa específico.

3 comentários:

  1. The political question of the borders, in this article, has been won by the extreme fascination of the views!

    ResponderEliminar
  2. Thank you so much for your comment!

    Yes. The place is awesome and pics taken at the moment of the sunset are the best. You can found many hues and many often the sky is clear and clean. So, you can watch a cozy landscape and smell the cropland or the fields of holmoak and the corktree with cows, pigs or sheets within. At summer, after an afternoon, often with 40ºC or more, see this view is very refreshing.

    At night you can experience the moonlight and a totally starry sky. I suggest you, if you can, to visit this region. I suppose for Estonian people it is something totally different you use to see. I liked to visit Estonia and I want to come back. Until that, you and I can to enjoy with pics and imagine how must be it.

    ResponderEliminar
  3. Mais um texto fantástico. E a Questão de Olivença por resolver a entorpecer, mesmo que subtilmente, as relações entre os dois estados peninsulares. Até quando???? :-(

    ResponderEliminar