terça-feira, 26 de outubro de 2010

Fronteiras: Cisterna/Barxa

Uma das fronteiras menos conhecidas seja talvez a que liga a aldeia de Cisterna, no extremo Norte do concelho de Vinhais, na Terra Fria Transmontana com a aldeia galega de Barxa. Isto apesar da proximidade de ambas as aldeias com o importante eixo de comunicação que é a chamada auto-estrada das Rias Baixas ou A-52 no troço que liga A Gudiña com Verín.

Mas não devemos esquecer que estamos perante uma das terras mais afastadas da civilização, mas com umas belas e espectaculares paisagens onde os rios se estendem quer em férteis veigas onde é possível um modesto desenvolvimento da agricultura, quer em vales encaixados com encostas íngremes que semelham a arribas nas que a floresta é dominante. Não é por acaso que estamos no limite mais ocidental do Parque Natural de Montesinho, cujo nome evoca outras terras próximas na realidade mas longínquas do ponto de vista das comunicações terrestres. E, no meio de tantas montanhas, existem pequenos planaltos onde se localizam pequenas aldeias como Cisterna onde o centeio é o cultivo dominante.

Nesta terra nunca os rios Mente e Rabaçal ficaram tão próximos o um do outro, sendo que depois divergem e serpenteiam até o primeiro desaguar no segundo pouco antes de chegar a Rebordelo, a ultima localidade do concelho de Vinhais antes de entrar no distrito de Vila Real. E é o rio Mente que faz fronteira numa parte do seu percurso, encaixado num vale profundo contrastando com os planaltos onde ficam aldeias como a da Cisterna.

Como sempre nestas terras fronteiriças, as oportunidades de usufruir da calmaria da Natureza e do contacto com gentes simples das aldeias, de passeios pela montanha ou da sua gastronomia, onde os enchidos são os reis. Não devemos esquecer as excelências do porco bísaro de Vinhais: um bom salpicão vale sempre a pena. Mas não fica para trás o presunto galego, muito parecido com o nosso presunto de Chaves. E é que o rigor do tempo invernal justificam este consumo de gorduras. Estamos perdoados, pois...

De resto, não existem muitas diferenças entre o lado português e o lado galego. O casario é muito semelhante a não ser a predominância, nestas terras, do telhado de xisto na Galiza, que no concelho de Vinhais encontra-se em franco declínio. Afinal de contas, estas aldeias partilham uma economia agro-pastoril de subsistência ou o que resta dela, resistindo-se a morrer nestes tempos tecnológicos. Definitivamente, mais uma visita que vale a pena!




Foto 1. Fronteira portuguesa vista do lado da Galiza.
Foto 2. Marco fronteiriço situado à direita da estrada.
Foto 3. Marco fronteiriço à esquerda da estrada e velha construção em ruínas.
Foto 4. Fronteira vista para os lados da Galiza.
Foto 5. Estrada de ligação à Barxas.
Foto 6. Vista geral de Cisterna.
Foto 7. Vista de Cisterna (pormenor).
Foto 8. Vista de Cisterna com Castrelo de Cima (Galiza) ao fundo.
Foto 9. Vale do rio Pentes (Rabaçal em Portugal) perto do limite fronteiriço.

Foto 10. Vista geral de Barxa.
Foto 11. Vista de Barxa (pormenor).

Foto 12. Cisterna vista da Veiga do Seixo (Galiza). O regato faz de limite fronteiriço (afluente do rio Mente).



Ver Fronteira Cisterna/Barxa num mapa maior
Mapa 1. Mapa de situação (Há um erro no mapa. Quirás fica mais a Sul. São Google nem sempre é perfeito!)

domingo, 17 de outubro de 2010

Curiosidades fronteiriças: Estrada da Petisqueira

A Raia está cheia de pequenas curiosidades fronteiriças que costumam passar desapercebidas para quem não liga a estas coisas ou quem não repara em pequenos pormenores a não ser que seja uma pessoa viciada em fronteiras, é claro!

É o caso da EM1039 que liga a Petisqueira à EN308 e daí a Deilão, sede da junta de freguesia, e a Bragança, capital do concelho. Esta estrada não é mais do que uma pequena estrada municipal que parece mesmo um caminho a nenhures, em uma região de lombas (não é por acaso que esta região recebe o nome de Lombada), com um pequeno planalto que em esta parte do território entra em um declive suave mas contínuo que faz com que a altitude, que no entroncamento com a EN308 é de 900 m., desça até os 690 m. já na Petisqueira.

Segundo a antropóloga Paula Godinho, Professora na Universidade Nova de Lisboa e talvez a melhor especialista em contrabando e fronteiras da Península Ibérica, esta estrada era conhecida por «estrada das forças armadas» e foi construída no PREC (Processo Revolucionário em Curso, que decorreu entre Abril de 1974 e Novembro de 1975), já que até esse momento o único elo de ligação com o território português era um caminho que só dava para a passagem de burros. Daí a forte interacção entre esta aldeia e as aldeias vizinhas de Riomanzanas e Villarino de Manzanas, na região alistana, muito mais próximas, o que se reflecte nas tradições populares, muito semelhantes, como tem posto em relevo o estudioso das tradições transmontanas António Tiza. Um exemplo disso é a celebração conjunta da festa em honra de Nossa Senhora de Fátima com Villarino nas margens do rio Maçãs, ou os falares raianos (ou o que resta deles) da Petisqueira, dentro do chamado dialecto maçaneiro, de origem asturo-leonesa.

Mas tem uma particularidade: uma boa parte da estrada está limitada pela fronteira de forma que podemos observar vários marcos fronteiriços ao longo da mesma e, ao lado, uns sinais de reserva de caça da Junta de Castela e Leão, já que estamos mesmo no limite com a província de Zamora, na região de Aliste. Parar nesta estrada, desligar o carro e ficar em silêncio faz com que, de repente, sintamos uma estranha solidão, uma sensação de sermos insignificantes, de estarmos mesmo sós, no meio daquelas lombas cheias de urzes, giestas e tojos, absolutamente sem árvores nenhumas, sem vermos aldeias por perto (ficam escondidinhas no fundo dos vales) e onde não há vivalma. Imaginem isso em uma manhã de Inverno, com um vento frio de rachar a passar pelo meu rosto. Eis que foi assim que eu me senti, mas em paz comigo mesmo. Afinal estava mesmo numa terra de ninguém e era possível usufruir de uma certa aura de liberdade, mesmo que fosse apenas uma ilusão, abstraindo-me do resto do mundo. Se puderem, experimentem no vosso local favorito. Vale a pena!

Foto 1. Marco fronteiriço junto à estrada da Petisqueira.
Foto 2. Estrada da Petisqueira ao lado do marco fronteiriço e do sinal da reserva de Castela e Leão.


Ver Fronteira na estrada da Petisqueira num mapa maior
Mapa 1. Mapa de situação.

P.S. Fico muito grato por ter como novos amigos a Suso Díaz, David García e Fátima Amante. As minhas boas-vindas e espero que continuem a gostar do blogue.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Fronteiras: Portela do Homem

No Parque Nacional da Peneda-Gerês, que agora faz parte também do Parque Transfronteiriço Gerês-Xurés, encontramos uma das fronteiras onde a paisagem envolvente da Natureza atinge uma espectacularidade ímpar. Falamos da fronteira da Portela do Homem.

Esta fronteira, para além de ser a única do distrito de Braga e do Baixo Minho, é a via de entrada entre a Galiza e o coração do Parque Nacional da Peneda-Gerês, no concelho de Terras de Bouro. As paisagens são, obviamente espectaculares e por si só merecem uma visita.

O lugar já fora muito transitado mesmo na Antiguidade, como mostram os restos arqueológicos existentes da via romana que ligava Braga (a antiga Bracara Augusta) com Astorga (a antiga Asturica Augusta), incluindo marcos miliários. Mas não só. A região é rica em águas termais, facto que põe em relevo pelas termas de Rio Caldo, no concelho de Lobios, na Galiza, e, obviamente, pelas termas do Gerês, já no nosso país. Mas, se a parte da Galiza as montanhas aparecem com pouca vegetação, já não é o caso da vertente portuguesa onde a floresta é rica e viçosa. Existem inúmeras espécies características do bosque atlântico que oferecem sombra e frescura nos dias quentes do Verão.

As caminhadas são uma óptima forma de conhecer o território em ambos os lados da fronteira, para além de obsequiar-nos com paisagens de indecifrável beleza. Do lado português o acesso está condicionado com o intuito de limitar o trânsito. É por isso que há dois postos de controlo: o primeiro, para quem vem da Galiza, mesmo depois de passar a fronteira; o segundo, na Portela de Leonte, depois de termos deixado a vila do Gerês. Antigamente o controlo fazia-se por intermédio de um bilhete onde os funcionários anotavam a hora de entrada para evitar paragens no meio do caminho, já que o tempo de percurso de carro estava limitado a 15 minutos. Agora faz-se um pagamento simbólico de 1,50 EUR. Esta parte do Parque Nacional da Peneda-Gerês recebe o nome de Mata da Albergaria e constitui a parte mais espectacular do percurso, o que inclui as cascatas do rio Homem, já perto da fronteira, e lugar ideal onde tomar um refrescante banho. As águas são mesmo limpas e cristalinas e existem piscinas naturais de até mais de 4 metros de profundidade. Além disso, daí parte um percurso até as Minas dos Carris, perto da nascente do rio Homem e perto, obviamente, da fronteira.

Não é preciso dizer mais nada: a região vende-se por si só!


Foto 1. Fronteira portuguesa vista do lado da Galiza.
Foto 2. Fronteira galega vista do lado de Portugal.
Foto 3. Fronteira portuguesa. Antiga alfândega e café.
Foto 4. Sinalética da fronteira (Foto enviada atenciosamente por David García Riesco, leitor do blogue).
Foto 5. Sinalética da fronteira (Foto enviada atenciosamente por David García Riesco, leitor do blogue).
Foto 6. Restos da via romana de Braga a Astorga, já em terras galegas.
Foto 7. Outra vista da calçada romana e dos marcos miliários.
Foto 8. Cascata do rio Homem, a 800 metros da fronteira.
Foto 9. Cascata do rio Homem em um dia quente de Verão.
Foto 10. Cascata do rio Homem (pormenor).
Foto 11. Portela do Homem (ao fundo) e vista geral do Parque Nacional da Peneda-Gerês vistos da Pousada da Caniçada.

Mapa 1. Mapa de situação.
Ver Fronteiras: Portela do Homem num mapa maior