terça-feira, 23 de abril de 2013

Miradouros da Raia: Penedo Durão (f. de Poiares, c. de Freixo de Espada à Cinta, Douro Internacional)

No concelho de Freixo de Espada à Cinta, na freguesia de Ligares, no Douro Internacional, encontrámos um belíssimo miradouro conhecido como Penedo Durão, situado a 727 metros de altitude. O miradouro configura-se como uma escarpa que cai quase a prumo para os lados da margem direita do Douro, na sua secção internacional, contrastando com o suave declive do planalto em que está situada a aldeia de Poiares, freguesia em que se insere o Penedo.

A freguesia inteira merece uma visita, tanto pela possibilidade de dar um passeio pela aldeia de Poiares, bem como pela existência de paisagens invulgares, de domínio de quartzitos, nos quais é possível observar a disposição dos materiais sedimentários do Paleozóico em dobramentos que a acção erosiva deixou ao descoberto, nomeadamente o chamado «sinclinal de Poiares». Aliás, e um bom lugar para quem goste da observação de aves, designadamente rapazes.

O penedo permite a observação de ambas as margens do Douro, no Douro Internacional. Do lado transmontano, o Planalto Mirandês foi substituído progressivamente por pequenos planaltos encerrados entre montanhas que, à beira do Douro, dão lugar a paisagens de arribas muito íngremes, como é o caso do Penedo Durão, que realmente não se eleva muito em relação ao planalto situado nas suas costas dado que este fica entre os 550 e os 650 metros. A beira-Douro encontramos já as clássicas paisagens em socalcos do Alto Douro Vinhateiro, com pequenas quintas que aproveitam um micro-clima especial, muito mais quente e resguardado dos rigores invernais em que a amendoeira e a oliveira florescem mais cedo lá onde o terreno não é apropriado para a cultura da videira. 

Do lado de Salamanca contrasta a escassa utilização do solo a nível do rio, existindo apenas uma pequena aldeia, hoje centro de férias chamada Aldeaduero, na foz do Huebra, que foi construída aquando da construção do «Saltinho», isto é a Barragem de Saucelle, a última das barragens do Douro Internacional, antes de entrar inteiramente em Portugal, para além de uma pedreira numa escalvada montanha situada perto da Fregeneda, a última estação espanhola da linha que ligava o Porto com Salamanca e que fora desactivada na década de oitenta do século passado. Para lá da zona das arribas, podemos observar uma extensa paisagem planáltica que se estende de Lagoaça até Barca d'Alva, pertencente à chamada peneplanície zamorano-salmantina, na parte ocidental da Meseta central, incluindo as terras de Ribacôa. De facto, é possível observar o outeiro em que está situada a aldeia de Castelo Rodrigo e a Serra da Marofa, a mais de 50 km. de distância pela estrada fora. A paisagem, no entanto, muda radicalmente, já que ao lado de espécies como o carvalho negral, o pinho e o castanheiro, encontramos outras mais meridionais como a azinheira que anunciam já uma particular paisagem de montado com certas similaridades com o Alentejo, se bem que adaptada aos rigores particulares dos frios do Inverno e dos calores do Verão.

Sem dúvida, um miradouro para dar um passeio de meia tarde ou numa rota em combinação com outros como o das Alminhas, Colado, Carrascalinho e Cruzinha, todos eles sem sair do concelho de Freixo de Espada à Cinta. E é claro, visitar a vila e as aldeias, sem deixar de comprar alguns dos produtos locais, entre os quais recomendo o azeite e o vinho de uma cooperativa do concelho.

Foto 1. Paisagem do Douro Internacional , antes do «Saltinho», com as terras de Salamanca do outro lado Douro. 
Foto 2. Barragem de Saucelle vista do Penedo Durão.
Foto 3. Aldeia de Saucelle vista do Penedo.
Foto 4. O «Saltinho» visto mais de perto, quase como que a ser sobrevoado.
 Foto 5. Vista do Douro, do rio Huebra e de Aldeaduero, com o planalto salmantino ao fundo.
 Foto 6. Vista da peneplanície salmantina, com o Miradouro do Penedo Durão em primeiro plano.
Foto 7.  Vista do Douro Internacional com a aldeia de Castelo Rodrigo ao fundo (pequeno outeiro da esquerda) e a Serra da Marofa, já na Beira Alta e nas terras de Ribacôa.
Foto 8. Foz do rio Huebra, a desaguar no Douro.
Foto 9. Vista geral de Poiares, em que o planalto de Salamanca quase não se distingue e não permite intuir as impressionantes paisagens que nos esperam.
Foto 10. Pôr-do-sol em Poiares com vistas para as terras planálticas da Beira Alta e Beira Transmontana (c. Vila Nova de Foz Côa e Mêda).


Mapa 1. Mapa de localização.

Mapa 2. Mapa específico.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Aldeias da Raia: Granja (c. de Mourão, Alentejo Central)

Sim, já sei que se passou algum tempo sem escrever nenhuma entrada. Um pouco de preguiça minha, reconheço. Mas hoje recompenso os meus leitores com umas belas vistas da Raia do Alentejo mais profundo, aquele que fica na margem esquerda do Guadiana. 

No concelho de Mourão fica a aldeia e freguesia da Granja, situada entre a capital concelhia e a freguesia da Amareleja, no concelho de Moura e tem aproximadamente uns 600 habitantes. O Grande Lago de Alqueva contorna desde 2003 a localidade, já que o encerramento das comportas supôs o alagamento dos vales dos ribeiros vizinhos. O relevo próprio da planície rompe-se aqui dando lugar a formas onduladas e vales mais profundos lá onde os cursos fluviais ainda não foram alterados pela barragem, em áreas mais isoladas, na própria Raia, designadamente a Ribeira de Alcarrache e o seu afluente, a Ribeira de Godelim ou as suas formas alternativas Guadalim ou Guadelim, que nasce em Espanha com o nome de Godolid e que remete para as suas origens árabes do termo uádi, que significa rio e que na língua portuguesa deu lugar, para além do prefixo guad-, o mais genérico ode-, odi- (daí topónimos como Odemira, Odeceixe, Odiana (forma medieval de Guadiana: o Alentejo era a região de Entre-Tejo-e-Odiana), Odiáxere, etc.). O limite fronteiriço fica mesmo nesses meandros formados pelas ribeiras indicadas, sendo possível avistar ao fundo a vila de Villanueva del Fresno, já na Extremadura espanhola. Infelizmente o acesso está barrado pelos proprietários das herdades, que vedam a entrada a toda pessoa estranha ao serviço. Daí que as fotografias só mostrem a fronteira ao longe. 

Mas para não desviar-nos da questão, a paisagem predominante é a de searas, vinhas e montados, com herdades espalhadas um pouco por todo o lado. Daí que a actividade agro-pecuária seja a dominante na localidade. As melhores terras costumam ficar restritas ao cereal e à videira, com especial destaque para o vinho da região designado como «Granja-Amareleja», com etiqueta de cortiça, que recomendo vivamente, se bem que não é um vinho barato ficando-se pelos 10-14 EUR dependendo do ano de colheita e se for reserva ou não. 

A localidade resulta muito amena, até porque o casario está especialmente bem conservado, espalhado harmonicamente em suave declive com a Igreja Matriz de S. Brás, de factura gótica, mas bastante reformado no século XVI e XVII, com algumas influências filipinas, com contrafortes nos laterais e uma porta de estilo classicizante com um escudo da Casa de Bragança situado abaixo de uma cruz da Ordem de Avis. Outro lugar muito agradável é a Igreja da Misericórdia, situada na Praça 25 de Abril, que outrora foi a sede do arquivo da localidade em que estavam sediados os tombos relacionados com a sua história e que terão desaparecido, infelizmente, na sequência das frequentes escaramuças fronteiriças na Guerra da Restauração. Do século XVI, destaca pela torre sineira ou Torre do Relógio, hoje centro de convívio. Para além destes monumentos, a aldeia presta-se ao passeio, à descoberta das típicas casas alentejanas, caiadas e absolutamente imaculadas de um branco alvíssimo, com especial destaque para um pormenor que a diferencia de outras no sentido de serem uma relíquia do passado: as chaminés alentejanas de tipo mourisco, redondas, por vezes com indicação da data em que foram construídas, que são especialmente frequentes e que representavam o estatuto social do proprietário. 

A sua história não nos é muito conhecida precisamente pela falta de documentos, tendo-se perdido estes. Pensa-se, no entanto, que aquando da Reconquista, os réis de Leão e Castela terão doado à Ordem do Hospital a chamada Granja do Hospital, fazendo parte do território do antigo reino de Leão, confirmado pelo Tratado de Badajoz de 1267 antes de passar à dominação portuguesa pelo Tratado de Alcanices de 1297 até hoje. A Guerra da Restauração causou muitos estragos na localidade, como já foi assinalado, mas isso não tirou nem um bocado a sua forte identidade cativante que ainda hoje possui. É como não podia ser de outra forma, nada melhor do que se misturar com a população local, nos cafés, ou simplesmente a passear. E para mais informações, nada melhor do que o excelente site relativo à localidade em que podemos encontrar até receitas de cozinha das especialidades locais e da região, para além de ampliar os nossos conhecimentos.


Foto 1. Uma herdade da Granja.
Foto 2. Paisagem de montado, com a fronteira da Ribeira de Alcarrache no fundo do vale e do outro lado o município de Villanueva del Fresno.
Foto 3. Vista de Villanueva del Fresno.
Foto 4. Paisagem de montado com destaque para o Grande Lago de Alqueva ao fundo (direcção de Mourão).
Foto 5. Vale fronteiriço na Ribeira de Alcarrache.
Foto 6. Ribeira de Godelim com a aldeia da Granja ao fundo.
Foto 7. O esplendor da primavera na Herdade da Ameada.
Foto 8. Entrada à aldeia da Granja.
Foto 9. Porta de entrada da Igreja Matriz.
Foto 10. Igreja Matriz de S. Brás.
Foto 11. Fonte situada na cabeceira da igreja.
Foto 12. Ruas da Granja.
Foto 13. Chaminé mourisca.
Foto 14. Chaminé alentejana de 1823.
Foto 15. Torre do Relógio.
Foto 16. Outras vistas da Torre do Relógio e de chaminés mouriscas.
Foto 17. Mais chaminés mouriscas e até com cata-ventos.
Foto 18. Uma verdadeira relíquia histórica: a insígnia antiga dos CTT em perfeito estado de conservação.
Foto 19. Igreja da Misericórdia.
Foto 20. Praça 25 de Abril.
Foto 21. Belos exemplos de casas bem conservadas. 
Foto 22. Ribeira de Godelim (cá Godolid), perto de Valencia del Mombuey, pouco antes de entrar em Portugal.


Mapa 1. Mapa de localização.

Mapa 2. Mapa específico.