sábado, 18 de fevereiro de 2012

Fortalezas da Raia: Castelo de Terena (Alandroal)

O Alentejo é uma região com um património incrível. Acho que isso fica fora de toda dúvida e é consensual. Praticamente qualquer localidade que teve alguma importância histórica apresenta um património arquitectónico singular. Por isso o Alentejo é uma das regiões nas que o viajante pode perder-se numa jornada prazerosa na que é possível conjugar uma boa gastronomia, belas paisagens e aldeias limpas e caiadas e um património digno de se ver.

No Alentejo Central é o caso do concelho do Alandroal. Talvez por ter ficado no meio entre Reguengos de Monsaraz e Vila Viçosa/Borba, soube manter melhor a tradição alentejana e as suas aldeias não foram tão afectadas pela modernização que descaracterizou grande parte do nosso país. Este concelho é rico em património: é o concelho dos três castelos, dos quais já falamos do castelo de Juromenha, à beira do Guadiana. Mas não só. Para além dos castelos do Alandroal e da Terena, do qual vamos falar, existem numerosas antas, cruzeiros e azenhas, algumas das quais, infelizmente, já submersas no Grande Lago após o encerramento das comportas da barragem de Alqueva.

O Castelo da Terena é singular pelo facto de não estar muito modificado em relação à sua factura original, que aproveitou um pequeno outeiro, do qual é possível contemplar uma ampla paisagem, dando lugar a um castelo de tipo pentagonal que data do último terço do século XIII. A localidade terá recebido foral em 1262 quando o cavaleiro-régio Gil Martins e sua esposa Maria João lho outorgaram. Ficou ainda famosa pela sua romaria na capela de Nossa Senhora da Boa Nova, celebrada no Domingo de Ressurreição e na Segunda de Pascoela, já nesse século porque é mencionada pelo rei sábio, Afonso X de Castela, nas Cantigas de Santa Maria. O Castelo formava parte da linha defensiva do Guadiana à qual pertenciam ainda os castelos de Elvas, Juromenha e Alandroal. De facto, já contamos com notícias, relativamente ao mesmo, da existência do castelo e da barbacã em 1380. Com a crise de 1383-1385, o rei D. João I doa o território à Ordem de Avis, o que deu lugar a uma ampla obra de construção. Já no século XV e XVI beneficiou de obras de ampliação, incluindo a Torre de Menagem, com o alcaide-mor Nuno Martins da Silveira, a partir de 1482, na qual terão participado os arquitectos Diogo e Francisco de Arruda, famosos, entre outras obras, pelo Aqueduto da Amoreira de Elvas. Contamos ainda com os desenhos feitos por Duarte d'Armas em 1509 no seu Livro das Fortalezas.

No entanto, o castelo perdeu importância a partir da Guerra da Restauração, facto que talvez explique a breve ocupação castelhana em 1652, já que não contamos com as clássicas fortificações abaluartadas que definem sobretudo a cidade de Elvas e os fortes da Graça e de Santa Luzia e ainda a fortaleza de Juromenha e de Olivença. Terá sido objecto de algumas obras de restauro, designadamente a chamada Porta das Sortidas, chamando a atenção o facto de estar de costas viradas para Espanha, o potencial inimigo. O terramoto de 1755 veio a fazer estragos no castelo não se tendo conhecimento de novas obras. A localidade, que era sede de concelho, abrangendo, para além da freguesia de São Pedro de Terena, as vizinhas de Capelins e Santiago Maior, perdeu o seu estatuto de capital de município quando este foi integrado no concelho do Alandroal em 1836, juntamente com o concelho extinto de Juromenha. Isso fez com que o castelo estivesse devotado à degradação até a quarta década do século XX em que começaram algumas obras de restauro que tiveram continuidade na década de oitenta.

A visita do castelo e da vila resulta altamente indicada para um passeio de domingo de Primavera, quando os campos ainda estão verdejantes e é possível ter uma vista da planície e outras amostras de património arquitectónico como os Antigos Paços do Concelho, o Pelourinho, a Torre do Relógio, o Santuário de Endovélico, a Igreja matriz de S. Pedro ou a Capela de Nossa Senhora da Boa Nova. Conta ainda com uma ponte e barragem no rio Lucefecit, de clara ressonância latina.


 Foto 1. Vista exterior da Porta das Sortidas.
Foto 2. Torre de Menagem vista do interior do castelo.
Foto 3. Torre de Menagem (vista exterior).
Foto 4. Porta das Sortidas com vistas para a planície.
Foto 5. Interior do castelo com vistas para a barragem de Lucefecit e a Serra d'Ossa (c. do Redondo) ao fundo.
 Foto 6. Vista do castelo (perspectiva).

 Foto 7. Interior do castelo e vista da barragem de Lucefecit.
 Foto 8. Torre de Menagem (ameias).
 Foto 9. Torre de Menagem vista para o exterior.
 Foto 10. Terena vista do castelo.
 Foto 11. Vista da planície para Leste, com a Serra da Lor (Olivença) ao fundo.
 Foto 12. Vista da planície para Sul.
Foto 13. Rua Direita vista ao sopé do castelo.


Mapa 1. Mapa de situação.

Mapa 2. Mapa específico.

3 comentários:

  1. Neste post, além de conhecer mais um pouco de uma zona do país praticamente desconhecida para mim, o que mais me chamou a atenção foi o nome do rio que passa em Terena: Lucefecit!!!!! Eu tive de ler três vezes para me certificar que não estava a ler de modo errado. Lecefecit! Qual será a origem deste nome?!?!?

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  2. Vem, sem dúvida, do versículo do Génesis em que se relata a Criação do mundo quando Deus disse: «Faça-se a luz. E a luz foi feita».

    Em latim clássico, «a luz foi feita» é «lucem fecit» ou «fecit lucem». Como no texto original a palavra «luz» ia em primeiro, o texto em latim ficou como dito no primeiro dos casos. Daí, na época medieval, com um latim já não restrito às normas clássicas, e em razão da sua pronúncia, terá dado lugar a «luce fecit» ou Lucefecit, como o é actualmente. Isto faz todo o sentido porque a região tinha ficado em mãos dos muçulmanos até a década de 30 do século XIII.

    Já o motivo de ter dado a este rio o nome, nada posso dizer porque não sou especialista na História da região, porque a minha especialidade é a História medieval no Norte, mais propriamente Trás-os-Montes, o que não significa que desconheça os factos mais relevantes da História do Alentejo, mas não com a mesma profundidade e dedicação do que dos da região transmontana e da região de Entre-Douro-e-Minho.

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  3. Muito Obrigado pela tua explicação! Tive que voltar a ver este post para ver se já haveria alguma resposta, uma vez que o blog deixou de permitir que se possa dizer que queremos ser notificados sobre novos comentários ao post. Será que és capaz de corrigir esse problema? Grande abraço! :-)

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