segunda-feira, 26 de março de 2012

Fronteiras: Sobral da Adiça/Rosal de la Frontera-III

A uns 2 km. da aldeia de Sobral da Adiça, quase no limite com o concelho de Serpa, separado pela Serra da Adiça da localidade do Ficalho, na que está situada a fronteira mais importante da região, contamos com outro ponto de passagem da fronteira pelo Vale de Grou para chegarmos até Rosal de la Frontera, na Andaluzia espanhola. Trata-se de uma fronteira local, com estradas em muito mau estado. De facto, na estrada N385 nem sequer existe um indicador que mostre que estamos perante um desvio que nos leva até ao limite fronteiriço. Até porque a estrada portuguesa é mesmo péssima, com um pavimento em muito mau estado e esburacada por momentos (atenção aos amortecedores!!!). Mas a estrada espanhola é ainda pior pois não estando esburacada, é uma estrada de cascalho sem pavimentar. De facto, o sinal de limitação da velocidade a 50 km/h parece uma piada de mau gosto a não ser que queiramos arriscar a ter amolgadelas no carro ou até mesmo partir os vidros indo a essa velocidade. Isso por não falar da poeira que iria cobrir o carro, pedindo-nos de imediato uma ida até uma estação de lavagem.

O mais notável neste aspecto é a paisagem. Uma paisagem de montado, designadamente de sobreiros, o que está a indicar uma maior humidade do clima, já que o sobreiro precisa de pelo menos 500 mm. de precipitação anual para ter umas condições óptimas de crescimento. Mas também uma paisagem de olival que cobre totalmente a Serra da Adiça para os lados que dão para a vila do Ficalho, fornecendo umas paisagens idílicas de paz e sossego. De facto, para além de uma ou outra herdade espalhada pelo campo, a vida selvagem tem todo o sentido neste lugar. Tivemos a oportunidade de ver perdizes a correr, assustadas as coitadinhas com o barulho do carro. O privilégio de ver os animais em liberdade não tem preço e nisso o Alentejo é um lugar de oportunidades nesse sentido, bem como a possibilidade de ver o céu estrelado enquanto o luar ilumina o montado. São, sem dúvida, momentos inesquecíveis para partilhar de forma romântica com a nossa cara-metade, abraçados os dois sentindo esse aconchego tão especial que só experimentamos com quem estamos apaixonados.

A fronteira é bastante curiosa porque está em parte delimitada por vedações de arame farpado salpicadas por vários marcos fronteiriços que mostram ao viajante avisado que estamos perante o limite fronteiriço entre dois estados. Como não podia ser de outra forma, essas vedações separam propriedades dedicadas à exploração da oliveira ou à pecuária, com especial importância do porco preto que, alimentado exclusivamente de bolotas, dá-nos a oportunidade de degustar essa iguaria sem igual que é o presunto de porco preto, também chamado de pata negra, que na vila de Barrancos atinge a sua máxima expressão e do lado da província andaluza de Huelva, no presunto de Jabugo, do qual é de salientar que uma parte importante dos porcos provêm do Baixo Alentejo, nos montados dos concelhos de Serpa e Moura, para dar saída à procura deste produto.

A região resulta indicada para visitar talvez algumas das aldeias mais autênticas do Baixo Alentejo, as que se situam na margem esquerda do Guadiana como Safara, Sobral da Adiça ou Santo Aleixo da Restauração, para além dos espaços naturais como a Contenda de Moura, cujo nome advém do facto de as fronteiras estarem mal definidas, o que deu lugar a conflitos entre um e outro lado pelos direitos de exploração e propriedade e que neste caso só finalizariam com o Tratado de Limites de 1927, quando se estabeleceram os marcos fronteiriços entre a Ribeira de Cuncos e a foz do Guadiana. Do lado da Andaluzia é possível visitar Rosal de la Frontera, vila fronteiriça e comercial onde poderemos atestar o carro e tomar umas cañas (cerveja a pressão) com tapas oferecidas de graça nas tascas do lugar. É interessante ainda a vila de Aroche e a sua contenda, que limita com a contenda de Moura na Serra de Aroche, na qual poderemos ver os restos do castelo. 

Importa salientar o facto de que esta região foi conquistada por Portugal aos mouros na última etapa da «Reconquista» num intento de atingir o controlo da região de Sevilha de forma que Aracena e Aroche, as localidades mais importantes da região, estiveram na posse de Portugal até pelo menos 1253. De facto, este território esteve em disputa com Castela a causa da questão do Algarve, já que o «rei sábio», Afonso X de Castela, detinha o título de rei do Algarve. D. Afonso III, que casou em 1253 com D. Brites, filha deste rei e mãe do futuro rei D. Dinis, recebeu do seu pai um dote que incluiu, após a morte do rei castelhano, as vilas de Mourão, Serpa, Moura, Noudar e Niebla (Huelva). O Tratado de Badajoz de 1267, que fixou as fronteiras na margem do Guadiana, serviu para assegurar para Portugal o chamado «reino do Algarve», facto que explica por que os réis portugueses intitulavam-se réis de Portugal e do Algarve. Em troca, Portugal abandonava os territórios além Guadiana. No entanto, a sagacidade política de D. Dinis permitiu-lhe, em substituição de uns alegados direitos sobre Aracena e Aroche, recuperar as vilas de Mourão, Serpa, Moura e Noudar no Tratado de Alcanices de 1297, para além das localidades de Campo Maior, Ouguela e Olivença. Séculos mais tarde, a guerra da Restauração foi terrível na região a causa dos contínuos assaltos das tropas castelhanas e portuguesas nas aldeias fronteiriças. O contrabando substituiu os conflitos bélicos e hoje, após a aberturas das fronteiras fruto da adesão à UE, o território tenta encontrar o seu lugar na economia moderna entre o declínio das estruturas agrárias tradicionais e a necessidade de apostar pela qualidade e a inovação tecnológica no sector agro-alimentar.

Foto 1. Fronteira espanhola vista do lado de Portugal.
Foto 2. Marco fronteiriço situado à Norte da estrada visto do lado de Portugal.
 Foto 3. O mesmo marco fronteiriço visto do lado de Espanha.
Foto 4. Segundo marco fronteiriço próximo ao anterior.
Foto 5. Linha de fronteira entre os marcos fronteiriços pela vedação de arame.
Foto 6. Marco fronteiriço situado a Sul da estrada, visto do lado de Portugal.
Foto 7. Linha de fronteira que vai pela vedação de arame.
Foto 8. Segundo marco fronteiriço a seguir ao anterior.
Foto 9. Linha de fronteira que segue a vedação de arame.
Foto 10. Fronteira portuguesa vista do lado de Espanha.
Foto 11. Linha de fronteira entre vedações.
Foto 12. Vale de Grou ao pôr-do-sol, com a Serra da Adiça à esquerda.


Mapa 1. Mapa de situação.

Mapa 2. Mapa específico.

P.S. O número de amigos que seguem este blogue pela rede social Google continua a aumentar com a recente incorporação de fernandopereirapinto, a quem damos as boas-vindas e esperamos que os motivos que o levaram a aderir perdurem no tempo, ganhando assim mais leitores assíduos deste blogue.

6 comentários:

  1. Me llama la atención que escribas: "cañas (cerveja a pressão)". En el Alentejo ¿no llaman "finos" a las cañas como en el norte de Portugal?.

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    1. La cerveza de presión recibe varios nombres: la más común es llamarla «imperial», aunque también se usa el término «tulipa» y también el de «fino». Depende de la región y del lugar. Donde vivo estoy más acostumbrado a oír el primer término. También llamamos «caneca» a la cerveza de medio litro. De todas formas, por lo menos en el Alentejo, no es tan frecuente ver cafés con dispensadores de cerveza a presión. La población aquí es escasa en comparación con otros lugares y en las pequeñas aldeas lo habitual es que haya tascas y cafés donde sirven lo básico, sin muchas florituras, aunque siempre hay sorpresas agradables: una pastelería de calidad o un bar con variedad de servicios. Sin embargo, es en las capitales de los municipios donde suele haber más establecimientos con este tipo de servicio, si bien dependerá del tipo de café o pastelería. Hay cafés que ofrecen sopa y también cerveza de presión, pero puede haber pastelerías que no lo ofrezcan porque están más especializados en los «bolos» y los «salgadinhos». Por otro lado, una tradición muy portuguesa, que se ha ido afianzando últimamente es la de tomar una «mini», una cerveza en botella de 20 cl., que es la que suelen tomar los trabajadores de «cuello azul» como los electricistas, trabajadores de la construcción civil, fontaneros, etc. Pero también gente como yo, con menos tolerancia al alcohol y que desea disfrutar de una buena cerveza helada en un día caluroso de verano sin acusar los efectos del mismo. Además, suele beberse «a morro» sin vaso, aunque te lo ofrecen si quieres. En muchos lugares te ofrecen también «tremoços», es decir, altramuces, que son bastante salados si se comen con piel, claro, pero que están muy ricos si se pelan. Ofrecen un agradable contraste, aunque claro, te dan ganas de beber más. Je.Je.Je.

      El tema de la hostelería es diferente en Portugal y en España y claro, también dependerá de la región. Los «bolos» y los «salgadinhos» (rissóis, chamuças, empadas de galinha, croquetes, etc.) son casi omnipresentes en cualquier establecimiento de calidad normal. Además siempre hay la posibilidad de comer «torradas» (tostadas con mantequilla), «tostas» que pueden ser con «fiambre» (jamón cocido), queso o «mistas» o «sandes» (bola de pan con jamón cocido, queso o los dos y con mantequilla). Variedad no falta, desde luego.

      Es cierto que en España hay sitios donde ofrecen con la caña o el refresco una tapa, pero en general los bares y cafeterías a veces son un poco deprimentes, salvo en la zona norte, como en Asturias, donde hay «pinchos» variados a buen precio. Y el café también deja mucho que desear en la mayoría de los lugares. Una vez más es en el norte donde tomo los mejores cafés, sobre todo el cortado y el café con leche. Para el café solo prefiero el que tengo aquí en Portugal. No me suele gustar.

      En fin, que me enrollé hablando de la cerveza pasando por los «salgadinhos» y terminando con el café.

      Espero que te haya contestado a tu duda. ;-)

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  2. Je, je, se de nota la vena de profesor. ;-)

    Es curioso que en Portugal tengáis variops nombres diferentes para la caña de cerveza y en España a pesar de las diferentes lenguas y mayor superficie se llame en todos los sitios "caña".

    Hablando de los bares/cafeterías, aquí en Asturias hasta hace casi media hora no se ofrecía un pincho con la consumición, ahora ya se va viendo más. En el sur sí que lo ofrecen casi siempre, pero también te lo cobran con un incremento del precio de la bebida.

    Lo que si es una verdad absoluta es que el café en Portugal está 100 veces más bueno que en España. ;-)

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    1. Bueno, la profesión va con uno, claro. Je.Je.Je.

      Respecto a lo que dije, parto de consideraciones subjetivas (mis experiencias), pero siendo yo bastante exigente, creo que no deben estar muy lejos de la realidad objetiva y palpable. Y la realidad es que zonas turísticas y mitad sur de España son horrorosas en cuanto a calidad y precio de las cosas, aunque hay excepciones honrosas. Aunque el café con leche no sea el mejor, en Extremadura, una buena catalana (pan tostado con aceite y tomate) con jamón es algo soberbio, por ejemplo. Es lo que tomo cuando debo desplazarme a desayunar a Badajoz, por ejemplo. No obstante, en las tapas se abusa mucho de los fritos, algo que para el paladar portugués resulta un poco excesivo, no porque no tengamos los nuestros (rissóis, croquetes, pastéis de bacalhau, pataniscas, etc.), sino porque en general, preferimos una «dose» de carne o pescado sin tanta fritura. Recientemente, en un restaurante buenísimo, alentejano, comimos entrantes variados de la región (paio, queijo, etc.) y buena carne alentejana: carne de porco no alguidar y cachaço de porco preto acompañado con diferentes tipos de migas, que acabé regándolo con un vino de Borba (DOC) y una sericaia com ameixa de Elvas, un postre típico de esta región rayana del Alentejo. Una experiencia soberbia!

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  3. Este artigo é um autêntico hino promocional ao turismo no Baixo Alentejo! Muitos Parabéns e que possas continuar a nos brindar com estas leituras tão fantásticas!! :-)

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    1. Pois. É disso que se trata. Fazer viagens e «literatura». Dar a conhecer estes recantos perdidos do nosso país. Embora eu seja o primeiro em gostar de ir no estrangeiro, acho que para quem costuma viajar (viajantes, segmentos de mercado de classe média ou classe alta) seria crime desconhecer a maior parte do nosso país e ter andado por um monte de países. Quer dizer, é claro que não podemos conhecer o nosso país a milímetro, mas não se justificaria que uma pessoa que vive, por exemplo no Alentejo, conheça a Índia e não conheça as maravilhas arquitectónicas de uma cidade como Évora. É a isso que me refiro. E se este blogue serve para abrir apetite, bem-vindo seja! ;-)

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